T'i Manel do Esfrega
Já lá vão muitos anos
Por minha terra passava
De vez em quando um mendigo
Carregado de farrapada.
Tudo quanto via apanhava
Aquele homenzinho
Ao seu corpo atava …
Andava assim carregadinho.
Quando chegava à povoação
Era uma algazarra
Está cá o Ti Manel
Juntava-se a garotada.
Andavam atrás dele
Mas um pouco afastados
Porque todos o temiam
De farrapos embrulhado.
Dormia no manto do forno
Mas o povo tinha cuidado
Mandavam-no descer
Enquanto estava apagado
Tão carregado andava
O povo se comovia
Tiravam-lhe a farrapada
No fogo tudo ardia
Tudo era feito com cautela
E prudência podes crer
O Ti Manel rejeitava
Todo este bem-fazer
Mas os mais fortes da aldeia
Lhe sabiam dar as voltas
Cortavam-lhe o cabelo e barba
Também lhe calçavam botas.
Ele era um homem alto
Ficava bem lavadinho
Nunca guardava comida
Só pedia um caldinho
Depressa voltava ao mesmo
Durava pouco a limpeza
Novamente se carregava
Era uma grande tristeza
Não bulhava com ninguém
Era um homem de paz
Para aqui ou para ali
Para ele tanto faz
Pelo Ti Manel do Esfrega
A todos peço uma oração
Não sei onde morreu
Nem onde os seus ossos estão
Mas gostava de saber
Onde acabou este homem
Que marcou a minha infância
E em que cemitério dorme
Descansa em paz Ti Manel
Seja lá onde for
Viveste tão abandonado
No coração tenho a dor
Para sempre ficou gravada e marcada
Na minha mente a sua imagem
Guardei-a no coração
Aqui lhe presto homenagem
Chamavam-no assim
Não sei qual a razão
Se era mesmo do Esfrega
Ou de outra povoação
Minha terra é Figueira,
Sobreira formosa a freguesia
Desde 1940
Que assim o conhecia
O Senhor José Ribeiro da Cruz
Com a sua mente fresquinha
Saberá acrescentar mais
Porque eu era pequenina
ANA LAIA CARDOSO
Coimbra, Dezembro 2013